terça-feira, agosto 21, 2012

Postais das Selvagens


3 - Selvagens à vista

Vislumbra-se o leve vulto da Selvagem Pequena no horizonte, sob o olhar
 atento de um dos marinheiros do N.R.P. Cuanza

Por volta das dez horas avistamos a Selvagem Pequena, nosso primeiro destino do dia. Por entre a neblina que demorava a levantar, avistamos um triângulo de lados desiguais, o pequeno pico que domina a ilha, que mais tarde me disseram chamar-se Pico do Veado. A silhueta da ilha foi crescendo no horizonte, como se se erguesse lentamente das águas, e eventualmente começamos também a ver o resto da ilha, composta por praias arenosas e muitas rochas, assim como os muitos ilhéus que circundam a ilha. Notava também na vertente da ilha um tom esverdeado da pouca vegetação que por lá cresce.
Assim que nos aproximámos, surgiram em redor do barco andorinhas-do-mar a dar-nos as boas vindas com os seus chilreios, assim como algumas gaivotas que nos sobrevoaram com o ar enfadado de quem se apercebe que este barco não era um pesqueiro e não oferecia nem peixe nem outra fonte de alimento. Surgiu também o bote dos vigilantes que depois de três semanas sozinhos, quais Robinson Cruzués voluntários, deviam estar ansiosos por voltar a ver outros entes da sua espécie. Com uma eficácia extraordinária, trouxeram para bordo o seu equipamento e uma quantidade tristemente impressionate de sacos cheios de lixo que tinham recolhido durante a estadia na ilha. O lixo, claro, não era dali, era oriundo de terras civilizadas distantes, na sua maioria plásticos numa profusão de garrafas, embalagens e caricas que nos lembram o impacto que a humanidade tem sobre este planeta, que se faz sentir até mesmo nestes lugares remotos e aparentemente selvagens e pristinos.
Acabado o embarque de pessoas e material na Selvagem Pequena, e avistado ali tão perto o tal Ilhéu de Fora que marca o limite sul de Portugal, o barco zarpou com destino à Selvagem Grande, o meu destino. A viagem que normalmente demoraria pouca mais de uma trintena de minutos, acabou por durar bem mais, fruto das obrigações de patrulhamento que naturalmente se exigem de um patrulha. Em vez de virar logo para nordeste, o barco teve de seguir para sul para controlar um barco que se aproximava indevidamente de águas portuguesas. Felizmente não houve necessidade de batalha naval. Ou por nos ter avistado, ou porque realmente não pretendia invadir as nossas águas, o barco virou para outras águas e libertou a marinha das suas funções mais bélicas.

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