domingo, setembro 02, 2012

Postais das Selvagens


9 - De noite ou debaixo de água

A maravilhosa água da Enseada das Cagarras.

Nas selvagens nem toda a gente consegue dormir bem. As cagarras, que lá existem às dezenas de milhares, são muito ruidosas, sobretudo ao anoitecer e ao amanhecer. Quer isso dizer que aqueles de sono mais leve frequentemente acordam por volta das cinco horas da manhã, altura em que as cagarras começam a sair para o mar para mais um dia de faina, fazendo questão de o anunciar ruidosamente, no seu zurrar coaxado repetido em milhares e milhares de bicos. O mar, no seu eterno duelo com as rochas, mantém também um burburinho constante, mas esse parece-me a mim mais embalo que despertador.
O mar é também um dos grandes entretens de quem faz estadias nas Selvagens. Não só agracia o olhar com o seu azul profundo e a eterna labuta das ondas, como nos oferece ali mesmo ao pé uma infinidade de cores e formas dos muitos peixes e invertebrados marinhos que abundam nas enseadas da Selvagem Grande. Geralmente era na Enseada das Cagarras, logo ali junto à casa da reserva, que eu passei horas e horas de óculos de mergulho e tubo de respiração postos, a nadar por entre as pedras a apreciar as vista submarinas, sentindo-me como que um pássaro a planar nos seus sobre os habitantes do mar. Por onde começar? Só quem já mergulhou em águas tão límpidas e pristinas como as das Selvagens podem imaginar a prodigiosa abundância de peixes. Desde as espécies nossas conhecidas do prato, como os sargos e as garoupas, aos vários cabozes, às tainhas, e a dezenas de outras espécies. Por todo o lado nadavam os coloridos peixes-verdes, e os bodiões, os machos mais cinzentos, as fêmeas vermelhas e amarelas. Um pouco mais longe das pedras encontramos cardumes de pequenas barracudas, de preguiçosas e de facaios, estes últimos muito engraçados com as suas barbatanas pretas e brancas. Mais junto ao fundo nadam as castanhetas, escuras com tons de azul quase florescente, e os porquinhos, pequenos peixes-balão de forma curiosa, cabeçudos e com uma lista clara lateral. Insistindo todos os dias, fui juntando novas espécies à minha lista, incluíndo a truta-verde, a salema, o lagarto-do-rolo, o peixe-cão, o vaso, o peixe-agulha, a boga, a dobrada e o rocaz e por vezes dava por mim no meio de enormes cardumes de minúsculos guelros. Lembro-me agora, que o assunto são os peixes e me sinto quase um novo padre António Vieira, que me esqueci de referir os peixes que pude ver a bordo do Cuanza, durante a viagem. Não foram muitos, mas a certo ponto avistamos um cardume de gaiados, pequenos atuns que no continente são mais conhecidos como bonitos, mas o mais engraçado foi mesmo o peixe-voador que vi saltar das águas junto ao barco e voar umas boas dezenas de metros até voltar a mergulhar nas ondas.

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