segunda-feira, setembro 03, 2012

Postais das Selvagens


10 - O planalto à noite

À noite, no planalto, somos bombardeados por cagarras e outras aves.

Sobre as noites na Selvagem Grande, já referi que eram embaladas pela ondulação e despertadas pela animação das cagarras, mas algumas noites eram também dias de trabalho. Como a grande maioria das cagarras só vem a terra de noite, a probabilidade de encontrar indivíduos não reprodutores é bem maior de noite. Amarinhávamos a subida à luz da lua, ou em noites mais escuras à luz da lanterna e com algum cuidado chegávamos ao planalto sem percalços. Numa noite de grande actividade o planalto à noite é muito, muito diferente do dia. Centenas e centenas de cagarras voam, rastejam e saltitam por todo o lado, estamos constantemente a ser bombardeados por carragas, almas-negras e roquinhos que passam a rasar as nossas cabeças, por vezes batendo mesmo ao de leve no nosso corpo. Para tentar capturar os indivíduos não reprodutores, caminhamos ao longo dos muros, tal como fazemos de dia, mas com lanterna e camaroeiro em riste, prontos a caçar as cagarras mais incautas. Tal como em tantas coisas, esta actividade tem um truque: caminhar a favor do vento, de forma a dificultar a descolagem das cagarras que precisam de apanhar vento contra para subir rapidamente. Mas não basta apanhar qualquer cagarra, entre as centenas e centenas que por ali andam temos de encontrar as que têm uma anilha cor-de-laranja numa pata e um aparelho de seguimento na outra pata. Apanhar uma destas cagarras numa noite de trabalho já é um excelente resultado. Estas aves são excepcionalmente fiéis ao local onde nascem e muitas vezes os animais não-reprodutores são jovens que nasceram à quatro ou cinco anos e estão agora a voltar pela primeira vez à colónia, onde se irão começar a reproduzir nos anos seguintes. Incrivelmente, elas são geralmente apanhadas a poucos metros do ninho onde nasceram.

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