terça-feira, setembro 04, 2012

Postais das Selvagens

12 - Selvagem

A Selvagem a vigiar o mar sobre a Enseada das Cagarras.

Nos filmes do oeste, entre vaqueiros e índios, era habitual surgir a expressão "cidade de um só cavalo", como termo pejorativo para pequenas cidades perdidas no meio do deserto, aquelas que nos filmes os índios atacavam e os vaqueiros salvavam. Pois a Selvagem Grande é um ilha de um só cão. Esse cão, aliás uma cadela, é a Selvagem. A homónima da ilha é uma cadelinha de pelo malhado preto e branco, sem nenhum raça óbvia, que dá as boas-vindas aos visitantes da outra Selvagem, a ilha, desde 2005. A Selvagem canina veio para a ilha em 2005, ainda cachorra, e desde aí viveu sempre na ilha, apenas com uma curta ida ao Funchal por motivos médicos no ano passado. Nota-se que ela não sabe ser cão. Talvez por ter sempre vivido entre pessoas, quando mostra os dentes está-se a rir, como uma pessoa, não pretendendo ameaçar ninguém com o vislumbre dos seus caninos, e quando não está a comer ou a pedinchar bolachas e queijo, ela gosta mesmo é de se deitar ao sol, a mirar o mar, pronta a avisar com alguns latidos a chegada de algum barco. Na verdade a Selvagem não é um cão de guarda muito bom, não é incomum ser ela a última a notar a chegada de alguma embarcação e nem sequer sabe guardar a sua comida, que geralmente acaba comida pelas lagartixas que se juntam às dezenas para roubar a ração ou outra comida directamente do prato da Selvagem.
Quando subimos ao planalto, para visitar os ninhos das aves, a Selvagem vem connosco, subindo com invejável facilidade a subida que a nós tanto custa. Que maravilha ter quatro patas e menos cinquenta ou sessenta quilos de peso! Não sei se ela sempre se portou bem junto das aves, ou se aprendeu ainda pequena o quanto pode doer uma bicada de uma cagarra mal disposta, mas enquanto trabalhamos a Selvagem limita-se a descansar na sombra de algum arbusto, sempre de olho na possibilidade de ser hora de voltar a casa que é sem dúvida a parte da ilha que ela mais gosta.
A Selvagem tem medo do mar, o que é uma fobia algo desagradável para quem vive numa ilha de pequenas dimensões. Ainda pequena, a Selvagem foi apanhada por uma onda, tendo apanhado um grande susto do qual só saiu com vida por sorte e desde aí mantém sempre uma distância confortável do mar, quer este esteja calmo ou borrascoso. Pode ter medo do mar, ser a última a ver os barcos que chegam à ilha, e não conseguir defender a sua comida das lagartixas, mas é impossível não nos apaixonar-mos pelo focinho felpudo e pelos olhos meigos e castanhos da principal habitante de quatro patas da Selvagem Grande.

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