sexta-feira, outubro 26, 2012

Postais das Selvagens

30 – Vampiros

Numa das noites encontramos duas almas-negras a lutar violentamente.     
Na última semana começamos o trabalho de recolha de sangue de vinte adultos e crias nos ninhos novos que fomos detectando nas semanas anteriores. Tínhamos um total de trinta e quatro ninhos, número mais que suficiente se não se desse o caso de alguns ninhos terem sido predados desde que foram encontrados e do problema já referido de os adultos não virem todas as noites ao ninho. Na primeira noite deste trabalho subimos ao planalto por volta das 22 horas, fazendo uma ronda dos trinta e quatro ninhos. Nos primeiros cinco ninhos encontramos quatro adultos e parecia serem favas contadas encontrar vinte em trinta e quatro... mas não foi. Depois da sorte inicial apanhamos vários ninhos que haviam sido predados e muitos em que a cria estava sozinha, pelo que no final da ronda tínhamos apenas onze adultos, ainda assim um excelente resultado, outra noite semelhante e estaria a amostragem feita.
No dia seguinte pela manhã começamos a amostrar as crias. Este trabalho não levanta grandes problemas, pois as crias estão sempre "em casa", mas recolher uma amostra de sangue de uma cria é um pouco mais difícil por serem mais pequenos e é uma daquelas tarefas que sabe um pouco mal fazer. Mas correu bastante bem, apesar de pequenas a veia braquial, na asa, é já perfeitamente visível, um risco escuro sobre o osso branco, logo abaixo da pele, junto à articulação correspondente ao nosso cotovelo. Neste primeiro dia amostrámos treze crias, parando apenas porque o vento fortíssimo que se fazia sentir nesse dia acabou por empurrar tantas poeiras para o meu olho que me causou forte incómodo e a necessidade de voltar à base para lavar o olho e colocar algumas gotas de colírio.
Chegada a noite, e com os olhos já em melhor estado, subimos novamente ao planalto para continuar a nossa actividade de vampiros. A noite correu bastante bem, não só colhemos as nove amostras de sangue de aves adultas que faltavam como ainda colocamos os primeiros quatro geolocators para seguir a migração. O vento continuava assustador, uivando aos nossos ouvidos sem para, e era necessário manter sempre os olhos semi-cerrados para nos protegermos da poeira que andava no ar. Apesar da tormenta, o único percalço foi uma alma-negra que por stress ou vingança me vomitou em cima uma mistura de lulas e peixe, a sua refeição mais recente. Acho justo, eu também lhes ando a espetar agulhas. Para acabar a campanha vampiresca, na manhã seguinte recolhemos amostras de mais sete crias. Com o treino era já bastante fácil colher sangue das veias diminutas das asas das crias, mas continuava a saber um pouco mal perturbar assim animais tão pequenos e jovens.
Missão cumprida! Mas ainda faltam colocar dezasseis geolocators pelo que temos ainda pela frente mais algumas noites de trabalho nos poucos dias que faltam da estadia.

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